Percepção musical é universal?
Que a música é universal nós já sabemos, mas será que a forma como cada indivíduo percebe e vivencia música é igual? Será que todas as pessoas neste planeta estão sujeitas a perceberem e, principalmente, preferirem determinado fator musical à outro?
Há tempos, pesquisadores tentam buscar uma resposta para uma grande questão – Será que a percepção musical é de fato universal? Por isso, existem muitas pesquisas onde a ciência tenta sanar esta dúvida.
Embora muitos tenham afirmado que a percepção musical pode ser universal, uma nova pesquisa (e bem interessante) sugeriu que, talvez, a percepção musical não seja universal – pelo menos os fatores referentes à consonância e dissonância.
Consonância e dissonância – uma provável resposta
O neurocientista do MIT, Josh McDermott e colegas, realizaram uma pesquisa sobre gosto (estética) e percepção musical. Para isso, eles usaram os fatores musicais referentes à consonância e dissonância.
Os pesquisadores compararam respostas a tons consoantes e dissonantes em pessoas em 3 grupos com localizações diferentes: Bolívia, Estados Unidos, e no povo Tsimané – uma sociedade nativa da Amazônia- BR, com exposição mínima à cultura ocidental.
A pesquisa revelou que, embora os sujeitos Tsimané fossem capazes de dizer a diferença entre vários tons musicais no mesmo grau que os sujeitos da Bolívia e dos Estados Unidos, eles classificaram acordes consonantes e dissonantes, e harmonias vocais, como igualmente agradáveis, enquanto os sujeitos bolivianos e norte-americanos tendiam a gostar de música consoante e não gostavam de ouvir música dissonante.
Os resultados indicam que as preferências por consonância não se desenvolvem em pessoas que não têm experiência com música ocidental. Ou seja, nossas respostas e preferência à música e sons consonantes não provém de aspectos fisiológicos ou biológicos, mas provavelmente à nossa exposição à harmonia musical ocidental.
Melhor dizendo, a preferência por sons consonantes ou dissonantes é um fator social e cultural e não biológico.
Embora o povo Tsimané não compartilhasse as mesmas respostas a trechos consoantes e dissonantes de música que foram observados em indivíduos bolivianos e norte-americanos, um estudo posterior descobriu que os Tsimané eram tão bons quanto os indivíduos expostos à música ocidental quando tinham que distinguir entre tons tocados juntos ou separados – indicando a plena capacidade dos três grupos em realizar o teste.
Conclusão
Esse estudo indicou que, embora todos nós tenhamos os mesmos aspectos fisiológicos e biológicos para processar a música, ainda sim, o que define nosso gosto e nossa percepção musical pode não ter a ver com essas questões anatômicas. Na verdade, o estudo mostrou que a preferência por sons consonantes à dissonantes é, provavelmente, um fator cultural e não orgânico. Isso quer dizer que, talvez, a percepção musical (como entendemos hoje) não é universal.
Referências
McDermott, J. H., A. F. Schultz, E. A. Undurraga, and R. A. Godoy. “Indifference to Dissonance in Native Amazonians Reveals Cultural Variation in Music Perception.” Nature. 2016.
McPherson, M. J., S. E. Dolan, A. Durango, T. Ossandon, J. Valdés, E. A. Undurraga, N. Jacoby, R. A. Godoy, and J. H. McDermott. “Perceptual Fusion of Musical Notes by Native Amazonians Suggests Universal Representations of Musical Intervals.” Nature Communications II. 2020.
Sherman, L., & Dennis, P. EVERY BRAIN NEEDS MUSIC -The Neuroscience of Making and Listening to Music. New York: Columbia University Press, 2023.